O prazo está se encerrando e, agora, não tem mais volta: a partir de 2022, todas as escolas precisarão inaugurar — para aquelas que ainda não o fizeram — o seu Novo Ensino Médio. Entre as várias modificações na organização curricular da etapa final da educação básica, aquela que mais se destaca pelo ineditismo no modelo pedagógico predominante no Brasil é a possibilidade de escolha, por parte dos estudantes, dos itinerários formativos que pretendem seguir. Há quem os confunda com a bem antiga (e ultrapassada) separação em clássico e científico, mas a proposta — ao menos em sua essência — passa longe disso.
Os itinerários formativos pretendem romper com a estrutura rígida e segmentada das tradicionais disciplinas curriculares, permitindo que haja um real aprofundamento na descoberta e na compreensão de diferentes saberes vinculados a uma área do conhecimento ou até mesmo integrados a mais de uma delas. Trata-se, portanto, de um conjunto de disciplinas operando em sintonia e se utilizando de metodologias que vão além da aula expositiva, como a aprendizagem baseada em projetos ou oficinas.
A concepção da organização curricular em itinerários formativos parte, sem dúvida alguma, de uma premissa: a do protagonismo dos estudantes. Cabe a eles a escolha do caminho a seguir e a participação ativa durante o processo de aprendizagem. Nesse sentido, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que orienta tal organização, prevê o desenvolvimento de um projeto de vida desses estudantes, tendo em vista se tratar de uma escolha que deve levar em conta propósitos, princípios e valores em uma fase bastante sensível do desenvolvimento humano.
Ao iniciar a última etapa da educação básica, o estudante estará diante do desafio real de, em última análise, buscar um sentido para sua própria vida. O que me move? O que desperta meu interesse? O que desejo alcançar? Qual função quero ter na sociedade? Qual vida eu quero ter? É uma profunda escolha ética, antes de profissional — afinal, esta deve partir daquela. Escolha que demanda uma atitude autônoma diante de sua própria jornada de desenvolvimento pessoal, pois implica assumir a responsabilidade pelo ônus e pelo bônus das decisões tomadas. (Aqui, cabe um aparte: é justamente pela complexidade da construção desse projeto de vida que a transição entre diferentes itinerários precisa estar prevista e disponível na organização curricular, em especial no primeiro dos três anos do Ensino Médio. Permitir que o estudante os experimente traz segurança para ponderações e convicções.)
Dito isso, é evidente que o Novo Ensino Médio exige que o estudante tenha desenvolvido, ao longo das etapas anteriores da educação básica, competências socioemocionais no âmbito da autogestão (determinação, organização, foco, persistência e responsabilidade) e da resiliência emocional (tolerância ao estresse, tolerância à frustração e autoconfiança). Que tenha tido vivências constantes, e não esporádicas, em um papel ativo diante de seu aprendizado, construindo na prática cotidiana sua autonomia como sujeito. Que tenha garantido ter recebido um olhar pedagógico que foi além de seu desenvolvimento cognitivo e acadêmico.
Logo, o Novo Ensino Médio exige um novo Ensino Fundamental. Enquanto estivermos presos a um modelo pedagógico que ainda se estrutura na segmentação dos saberes, na rigidez do tempo e do espaço, na postura passiva do discente, na padronização do aprendizado e em normas de conduta obsoletas, não teremos estudantes prontos para o novo — seja o Ensino Médio, seja o mundo.
Profª Larissa Felipe é educadora, gestora escolar e assessora pedagógica. Atualmente integra a equipe da Escola Hub em São Paulo. Conheça o seu curso EAD de AVALIAÇÃO FORMATIVA E SOMATIVA NA PRÁTICA.
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